"Mistério é um mistério, oras!", responde a maioria das pessoas, desinformadas do real significado desta palavra, que se perdeu no tempo e assumiu ares de Ocultismo ou "coisa misteriosa". Mas a doutrina de Umbanda esclarece o que é um mistério, e mergulhou no passado ancestral para devolver a esta palavra seu real significado.
Afinal, dizer que a distribuição do pão e do vinho é um mistério, no mínimo , demonstra um desconhecimento do real significado das palavras ou dos rituais religiosos.
A renovação da presença da divindade no corpo do ser pelo concurso de alimentos consagrados não é um mistério em si mesmo, e sim um procedimento que visa a revitalizar a fé no poder imanente da divindade cultuada. É apenas a absorção do poder ou axé da divindade por meio de alimentos. E isso fazem todas as religiões desde que este mundo é mundo, e assim sempre será. Basta estudar os rituais religiosos que sempre encontraremos o homem e as divindades se renovando na partilha de alimentos.
As oferendas rituais atendem a essa necessidade do ser e das divindades em compartilharem os alimentos consagrados, pois ceia é sinônimo de fraternidade, confraternização e vida.
Agora, o que é ativado com a oferenda ritual, aí sim, é um mistério. Um mistério é algo intangível, mas que tem vida própria e só precisa ser ativado pelo fiel.
As divindades são mistérios de Deus e não existe mistério que não seja a manifestação de alguma divindade. Em Oxalá, encontramos o mistério da Fé, e a fé é irradiada por ele o tempo todo. Em Oxum, encontramos o mistério do Amor, e o amor é irradiado por ela o tempo todo.
Se o ser vibra a fé pura, é inundado pelas irradiações de Oxalá; se vibra amor puro, é inundado pelas irradiações de Oxum. Mas, se o ser vibra descrença, não é alcançado pelas irradiações de Oxalá, e se vibra ódio, não é alcançado pelas irradiações de Oxum.
Por que as coisas acontecem assim?
Bom, cada mistério vibra em um padrão específico e basta nos colocarmos conscientemente em sintonia vibratória com ele para que nos inunde com suas irradiações.
Então já sabemos que os mistérios vibram, cada um em um padrão próprio, e os encontramos em nós mesmos, mas na forma de sentimentos, certo? E que, para os ativarmos, basta que estejamos vibrando intensamente o sentimento afim com cada um deles. Se vibramos fé, somos inundados pelas irradiações do mistério da Fé. E se vibramos amor, somos inundados pelas irradiações do mistério do Amor, pois estas irradiações não cessam nunca, e só precisamos estar vibrando no mesmo padrão para recebê-las.
O Ocultismo ele surgiu quando ocultaram que os mistérios de Deus, todos eles, também estão em nós, e um tolo qualquer interpretou que a expressão "o homem feito à semelhança de Deus" diz respeito à semelhança física!
O fato é que, na doutrina de Umbanda, estudam-se as divindades recorrendo à analogia para identificá-las por meio dos mistérios que irradiam. Também se estuda o homem para descobrir com qual ou quais mistérios ele está ligado, e descobrimos que, vibratoriamente, podemos acessar mentalmente todos os mistérios de Deus, desde que estejamos irradiando sentimentos afins com as irradiações deles.
Este "todos os mistérios de Deus" é relativo aos nossos limites humanos, certo? Aqui, limitamo-nos à interpretação do homem feito à imagem e semelhança de Deus.
A doutrina de Umbanda buscou na ancestralidade a origem dos mistérios e encontrou os mesmos mistérios em divindades aparentemente diferentes.
Em Oxalá, Buda, Atom, Cristo, etc., encontrou o mistério da Fé; em Oxum, Isis, Afrodite, Quanyn, etc., encontrou o mistério do Amor em seu sentido mais amplo. Logo, se essas divindades irradiam continuamente a fé ou o amor, todas são mistérios da Fé ou do Amor. E não dependem de nós para existir ou irradiar as vibrações de fé ou de amor, pois são divindades manifestadoras dos mistérios divinos da Fé e do Amor.
Agora, para nos inundarmos com as irradiações de fé e de amor, basta vibrarmos os sentimentos de fé e de amor e direcionarmos nossa mente a Oxalá e Oxum e, no mesmo instante, nosso espírito imortal é envolvido pelas irradiações vibradas por estes Orixás.
Isto sim é um mistério, pois existe e se manifesta em nós, pouco importando onde estivemos;
Um espírito, ainda que esteja "paraíso", se começa a perder sua fé, cai vibratoriamente e, se não a recuperar, poderá descer até as Trevas. Outro, estando no inferno, se começar a vibrar a fé em Deus, poderá ascender às esferas de Luz.
Isto é um mistério e, desde que o acessemos por meio dos nossos sentimentos verdadeiros, seremos aluados com intensidade.
Então já sabemos que os rituais de oferendas alimentares são recursos legítimos para estimular o ser em uma direção bem definida pelo próprio ritual para ajudar o ser a se concentrar e ativar um mistério. Por isso, a doutrina de Umbanda recomenda a oferenda ritual como um recursos que as Divindades, em infinita generosidade, permitem que usemos, pois facilita a nossa elevação vibratória, assim como o acesso mental ao padrão vibratório por onde fluem as irradiações do mistério de Deus, do qual ela é manifestadora natural pois é uma divindade.
E se as Divindades estimulam os rituais, é porque sabem que nós temos em nós mesmos tantos padrões vibratórios que basta que ativemos um, o da fé, por exemplo, para inundarmo-nos de fé, e também para que nos tornemos irradiadores da fé.
Isto sim é um mistério!
Um cristão mentaliza Jesus Cristo, põe-se em oração e se sente inundado de irradiações de fé; um budista mentaliza Buda, põe-se em oração se sente inundado de irradiações de fé; um umbandista mentaliza Oxalá, põe-se em oração e se sente inundado de irradiações de fé.
Mistério é isto: algo que existe por si só e está à disposição de todos, desde que entrem em sintonia vibratória com o padrão por onde ele flui o tempo todo. As vibrações de fé podem estar direcionadas a divindades diferentes; mas, como são mistérios de Deus e manifestadoras divinas do mistério da Fé, todos os fiéis do nosso exemplo sentem-se inundados pelos eflúvios das irradiações vibradas pelas divindades manifestadoras dos mistérios da Fé.
Logo, a fé é um mistério de Deus que encontramos em nós mesmos, e também irradiamos eflúvios estimuladores em nossos semelhantes quando estamos vibrando intensamente na fé. Já as divindades Oxalá, Buda e Jesus são mistérios da Fé porque estão irradiando a fé em Deus o tempo. Se observarmos o amor, veremos que o mesmo ocorre com ele, porque é um sentimento divino manifestado por quem vibra no amor.
Com todos os mistérios ocorre a mesma coisa: se nos sintonizarmos vibratoriamente com eles, tanto receberemos suas irradiações divinas como nos tornaremos irradiadores deles. Se isso acontece, é porque fomos feito à imagem e semelhança de Deus e, guardadas as proporções, somos micro irradiadores dos Seus mistérios divinos.
Somos capazes de irradiar fé, amor, justiça, ordem, conhecimento até podemos gerar, a partir de nós mesmos, novos seres semelhantes a nós, inventos, idéias, etc.
Então a doutrina de Umbanda vê o homem como o ser feito à imagem e semelhança de Deus, e portador dos mistérios divinos concernentes à espécie humana.
Por isso, a exemplo dos antigos mystas e magos, ela recomenda o estudo dos mistérios; pois, sempre que se estuda um, descobrimos que somos capazes de ativá-lo externa e internamente. No externo, a ativação acontece quando vibramos um sentimento afim com uma divindade. E internamente acontece quando, após nos colocarmos em sintonia com o mistério irradiado pela divindade, conscientemente passamos a irradiar o mistério dela para nossos semelhantes.
As divindades irradiam seus mistérios no sentido vertical e nós os irradiamos no sentido horizontal, ainda que as irradiações aconteçam em um círculo de 360 graus, igual à circunferência.
Assim, um médium dotado de várias faculdades mediúnicas precisa passar por um aprendizado durante o qual irá aperfeiçoar-se e colocar-se em sintonia vibratória com as divindades portadoras dos mistérios que ele está apto a manifestar.
As divindades são mistérios em si mesmas, porque estão de tal forma sintonizadas com Deus que manifestam os mistérios dEle, a origem de todos os mistérios. Logo, o médium tem de fortalecer cada vez mais sua fé em Deus, pois só assim ele, o micro, será uma individualização do macro e irradiará horizontalmente o que lhe chega na vertical, ou do alto!
A diversidade de dons mediúnicos é a prova da existência dos mistérios. Uns irradiam mistérios da Fé, outros irradiam mistérios do Amor, do Conhecimento, da Justiça, da Evolução, da Ordenação, da Geração.
O estudo das divindades nos dá o conhecimento necessário para identificarmos com qual delas um médium está ligado. E, descobrindo isso, só precisamos estimulá-lo a se aperfeiçoar e direcioná-lo conscientemente no sentido do seu dom ou mistério. O resto ele fará por si, pois traz em si mesmo a centelha divina que crescerá a partir de seu íntimo e sustentará suas irradiações de amor, fé, etc.
Jamais chegaremos aos mistérios se nos limitarmos somente ao estudo do homem, o qual não pode ser dissociado de Deus e das divindades.
Deus está no topo de todas as hierarquias divinas. As divindades formam seus degraus e graus. O homem forma a base de todas as hierarquias, por meio das quais vai evoluindo e galgando graus conscienciais cada vez mais elevador. E tanto galga esses graus que muitas das hierarquias do Ritual de Umbanda Sagrada são pontificadas por espíritos humanos já ascencionados.
Por ascensos entendam espíritos que evoluíram tanto, mas tanto, que se em mistérios de Deus... em si mesmos. E consagraram-se à humanidade, auxiliando os espíritos que ainda estão trilhando o caminho às esferas celestiais.
O homem não é um ser perfeito em si mesmo, mas, por ser uma centelha divina portadora dos mistérios de Deus, passa então por aperfeiçoamentos conscienciais que o tornam manifestador dos mistérios divinos herdados do seu Divino Criador.
Assim como o homem-carne herda as características genéticas de seu pai, também o homem-carne, o homem-espírito herdou de Deus os mistérios divinos, todos eles armazenados na centelha divina que o anima e o sustenta vivo, vibrante, irradiante e pensante.
Nesta herança divina guardada na centelha original está o sêmen original que, depositado no ventre da mãe divina, que é o Universo, gera um ser análogo a Deus, mas limitado à sua condição de ser espiritual, ainda sujeito a tornar-se um ser divino.
Na doutrina de Umbanda, estudam-se os mistérios e dedica-se uma atenção especial à forma como eles se mostram, atuam e influem na vida dos espíritos, porque eles não existem apenas por existir. Eles atendem a desígnios de Deus e são manifestadores de qualidades, atributos e atribuições pertencentes somente a Ele, o Divino Criador.
Em Deus está a origem, meio e fim de todos os mistérios.
Uma divindade tanto manifesta quanto guarda em si mesma vários mistérios. Logo, mistério e divindade são sinônimos de algo que pertence a Deus e é indissociável dEle, pois só N'Ele encontra sua origem, sustentação e finalidade.
Sim, a finalidade de todo mistério e divindade é facilitar, de alguma forma, nosso crescimento interior, nossa evolução individual ou coletiva e nossa ascensão vibratória.
Por isso citamos o caso da oferenda ritual e dissemos que não são mistérios, mas, sim, chaves que ativam os mistérios de Deus. E também citamos o homem feito à imagem e semelhança de Deus, como um portador natural de dons análogos aos mistérios divinos.
Existe um Orixá Oxóssi, que é o irradiador natural de muitos ou todos os mistérios "vegetais" de Deus, e também existem espíritos que respondem pelo nome simbólico "Sete Flechas", irradiadores de um ou vários mistérios do Orixá Oxóssi. Dão continuidade às hierarquias divinas, ocupando seus graus vibratórios humanos, pois são espíritos e são humanos.
Os Orixás são mistérios de Deus e nunca os conheceremos em sua totalidade. Mas o estudo dos mistérios vai nos mostrando onde e como eles atuam.
Mas a verdade é que os tão procurados mistérios de Elêusis, da Tábua de Esmeralda ou os mistérios egípcios estão ocultos por trás dos nomes simbólicos usados pelos espíritos guias de Umbanda e foram conservados em suas essências pelos Orixás. São as mesmas divindades invocadas pelos mystas, pelos magos, pelos hierofantes, pelos cabalistas, só que com outros nomes, pois eles falavam outras línguas e os mostravam com outras aparências em razão de outras culturas e etnias os humanizarem para serem mais bem cultuados... e ocultados.
Afinal, seria um contra-senso Deus criar a todo instante uma nova divindade e um novo mistério só para atender às nossas necessidades imediatistas acerca do mundo sobrenatural.
A verdade é que as divindades maiores ou planetárias são só umas poucas e sempre foram as mesmas, mas possuem inúmeras hierarquias e recorrem a elas quando precisam atender a um povo, ou mesmo a um numeroso grupo de espíritos afins e no mesmo nível evolutivo. Aí, a hierarquia intermediária escolhida acerca-se de espíritos intermediadores afins com as necessidades dos espíritos confiados a ela, e abre ao plano material o seu mistério intermediário, o qual atrairá todos os espíritos afins nos dois planos da vida. Assim, surge na face da terra uma nova religião ou uma seita dissidente de uma religião já existente e muito antiga.
Afinal, Deus não cria a todo instante novas divindades e novos mistérios só para nossa satisfação pessoal. Mas Ele, em Sua infinita bondade, renova antigas divindades e antigos mistérios e os adapta às nossas necessidades atuais. Assim, nunca nos deixa desamparados em nossa contínua renovação íntima, que acontece toda vez que reencarnamos.
Atentem para isso e entenderão que os antigos mistérios, famosos mas desconhecidos de todos, na verdade, estão renovados, e dentro do Ritual de Umbanda Sagrada. Eles não são outros senão os nossos sagrados Orixás, tão cantados mas pouco conhecidos, porque ninguém e nenhum dos seus estudiosos se dispôs a analisá-los segundo o modelo preconizado pela doutrina de Umbanda Sagrada, que, antes de mais nada, estuda o humano por meio do divino, e vice-versa. Só assim, cruzando os mistérios humanos com os mistérios divinos, descobrimos que macro e micro se correlacionam e que realmente fomos feito à imagem e semelhança de Deus!
Tentar estudar os mistérios por intermédio das lendas é uma tarefa árdua e, às vezes, inócua. Mas estudá-los a partir das qualidades divinas dos Orixás e das qualidades "humanas" dos espíritos, aí sim, sempre chegamos a bom termo pois descobrimos que a pedra que forma o ápice de uma pirâmide e as que formam sua base são feitas da mesma substância.
Então, se quisermos saber da consistência da pedra localizada no ápice inalcançável, o melhor meio é estudarmos a pedra da base, que está ao nosso alcance e sustenta toda a construção erigida sobre ela.
Extraído do livro "Código de Umbanda"
de Rubens Saraceni – Editora Madras
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